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domingo, 11 de abril de 2010

O perfil do cientista novo-paradigmático


Vasconcelos desenvolve no capítulo 5 os pressupostos do pensar sistêmico e de como o cientista novo-paradigmático incorpora esses pressupostos no seu “ser cientista.” “Pensar sistemicamente – afirma a autora- é pensar [seus pressupostos] a complexidade, a instabilidade e a intersubjetividade” . A autora apresenta um resumo do perfil do cientista novo paradigmático no Quadro 23, pg. 152 do livro.


O cientista que atua dentro do novo paradigma científico é alguém que:


  1. Amplia o foco de observação. Ao invés de isolar o fenômeno observado de outros a que possa estar correlacionado ou em interação, o cientista novo paradigmático busca compreender as inter-relações entre os diversos sistemas que possam estar influenciando o fenômeno observado. Ainda, entende que o fenômeno observado é parte de algum sistema pelo qual é influenciado, e que o próprio fenômeno observado influencia o sistema que a seu turno volta a influenciar o fenômeno observado, em uma dinâmica recursiva. Assim, o cientista novo-paradigmático contextualiza o fenômeno observado dentro de sistemas e leva em conta as interações recursivas.

  2. Acredita nos processos de auto-organização: trabalha com a mudança no sistema, i.é., aceita as variações e instabilidades no sistema, já que nada “é”e tudo “está”. Ou seja, de um instante a outro tudo pode mudar. Aceita que não controla os processos, pois esses dependem de outros processos além do fenômeno observado.

  3. Adota o caminho da “objetividade entre parêntesis”, ou seja, o cientista novo paradigmático sabe que é parte do sistema, e que sua verdade sofre influências de sua própria visão de mundo, sendo ela única, pois não há duas pessoas que percebam a realidade da mesma forma.


    Comentário da aluna: por ser proveniente de família oriental (pai e mãe japoneses), o paradigma apresentado pela autora do livro lembra aspectos da cultura oriental, transmitidos por meio das tradições. A noção de conjunto e de um todo que influencia as partes é entendida como uma perspectiva bastante óbvia e natural na tradição japonesa. Há vários contos infantis onde seres humanos nascem de um pêssego (Momo-taro-san) ou de um bambu (Kaguya-hime), transmitindo a noção de que a natureza e o ser humano são na realidade uma coisa só. Também já é de conhecimento do Ocidente de que a medicina oriental analisa não a doença, mas o doente, percebendo a inter-relação entre os vários sistemas que compõem o ser humano. Na cultura tradicional onde o imperador era aceito como sendo o filho de deuses que são responsáveis pelos processos da natureza, nela incluindo os seres humanos, a necessidade de controlar processos torna-se desnecessário. Há um misto de tranquilidade para aceitar as coisas como são, dada a confiança existente de que os deuses estão gerenciando os processos. A intersubjetividade parece ser especialmente presente nas culturas orientais: no idioma japonês, por exemplo, a pessoa educada não deve afirmar que algo “é”,mas que algo “parece ser”, colocando implicitamente de que o que está sendo externado é subjetivo, portanto, sujeito a questionamentos.

Observados esses pontos acima, pergunta-se se o cientista oriental estaria mais próximo de atuar dentro do novo paradigma proposto por Vasconcelos. Paradoxalmente, na opinião desta aluna, não. Embora o alicerce cultural da tradição encaminhe o pensamento oriental para os princípios da complexidade, instabilidade e intersubjetividade, a visão de mundo do japonês permaneceu fechada em sua cultura por muitos séculos. Ou seja, para o povo japonês só existia o Japão, e tudo o que fosse diferente do conhecido era considerado como perigo. O pensamento, embora orientado para uma tendência sistêmica, era realizado dentro de um sistema fechado, qual seja, o mundo japonês. O alargamento da visão de mundo, inicialmente com a abertura do Japão na era Meiji, e atualmente com a globalização, teoricamente traz as condições para a transposição do pensamento de tendencia sistêmica para um meio mais abrangente factível e possível. Ocorre no entanto de que essa mesma interação do Japão com o ocidente influenciou a visão de mundo do povo japonês, fazendo com que o paradigma cartesiano do ocidente passasse a ser aceito no Japão como sendo o novo paradigma universal, ou seja, uma verdade mais moderna, adequada aos novos tempos . O porquê da troca de paradigma no Japão e uma pesquisa no Japão atual de como seria visto o paradigma proposto por Vasconcelos poderia ser objeto de estudos...

Fonte: VASCONCELLOS, M. J. E. de. Distinguindo dimensões no paradigma emergente da ciência contemporânea. In: Pensamento sistêmico: o novo paradigma da ciência. 8. ed. Campinas, SP: Papirus, 2009. p. 152

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